LIVE Amigos ENFF realizada com Arthur Chioro e Maria da Paz
A Associação Amigos ENFF realizou uma Live com o ex-ministro da Saúde Arthur Chioro, no dia 05 de abril, sob o tema “Pandemia, vacina e saúde pública brasileira”. O debate contou também com a participação de Maria da Paz, médica e militante dos Médicos e Médicas Populares, e do MST; e a mediação do Coordenador da AAENFF, Fábio Venturini.
Brasil: epicentro da pandemia
No debate, que levantou as consequências do negacionismo do governo Bolsonaro no combate à pandemia, Chioro afirmou que “o Brasil tem 2,7% da população mundial, e hoje nós somos responsáveis por um terço praticamente dos casos e dos óbitos em escala global. Acho que isso por si só dá uma dimensão do tamanho do problema”. O ex-ministro lamentou que a essa altura, o Brasil tenha mais de 20 mil mortes por semana por Covid, e o governo Bolsonaro não faça nada a respeito, ou pior, continue a agir para que haja mais mortes. “Isso significa, só para dar uma dimensão, 8 World Trade Centers desabando em uma semana. É praticamente como se um atentado terrorista daquela magnitude que chocou o mundo acontecesse por dia no Brasil. E parece que essa tragédia, esse genocídio de brasileiros e brasileiras não tem sido suficiente para mobilizar o conjunto da sociedade brasileira para produzir uma reação à altura da dramaticidade do momento que a gente vive”, lamenta, afirmando ainda que “nós vamos ter ainda um mês de abril terrível”.
Para Arthur Chioro, essa tragédia brasileira tem nome e sobrenome: o governo Bolsonaro: “Em primeiro lugar os erros gravíssimos de condução do enfrentamento sanitário, que remontam a antes mesmo da pandemia, quando o Mandetta, aquele que vestiu o colete do SUS no Carnaval e gostou, mas sempre foi um adversário ferrenho do SUS, junto com Bolsonaro. Detonaram, destruíram o Programa Mais Médicos, destruíram a nossa capacidade de resposta na Atenção Básica”, lembrando de programas exitosos nos governos Lula e Dilma, como o Mais Médicos, e investimentos no Sistema Único de Saúde, agora estrangulado pela Emenda do Teto de gastos públicos.
Para Arthur Chioro, o Brasil também não tem vacinas suficientes por uma ação e decisão do governo Bolsonaro, que rejeitou participar do Fundo Covax-Facility da OMS, que destina vacinas aos países, e a ‘politização’ da Coronavac, da parceria da chinesa Sinovac com o Instituto Butantã, associada ao governo paulista e à parceria com a China, atacada pelos bolsonaristas como uma vacina ‘comunista’. Hoje se sabe que aproximadamente 90% das vacinas até agora aplicadas nos brasileiros vem do Butantã.
Para ele, há um efeito perverso nesta pandemia. “A Covid não é ‘democrática’ e nós pagamos o preço da desigualdade estrutural da sociedade brasileira. A Covid continua matando, continua acometendo com maior gravidade as pessoas pobres, as pessoas pretas, as pessoas que vivem nas periferias, inclusive os mais idosos, e entre aqueles que têm mais comorbidades também não tem um padrão igual de acometimento. Portanto ela viceja exatamente nesse encontro entre a desigualdade e um grande desafio sanitário”, diz Chioro.
Cuba: atenção básica à saúde faz a diferença
Para a médica Maria da Paz, há uma enorme diferença no tratamento dado à pandemia no Brasil e em Cuba, em que pese a ilha do caribe ser muito mais pobre que o nosso país. “Bom, é certo que em Cuba existe pobreza, mas não existe miséria. O serviço de Saúde está todo organizado e estruturado para responder às necessidades das pessoas; então é de fato saúde coletiva, porque está para responder à necessidade das pessoas. E tudo de forma organizada, estruturada, protocolada, em base na ciência”, afirma, e isso contribuiu para a redução dos impactos da pandemia do Covid naquele país.
Maria da Paz diz ainda que Cuba “é um país que já está acostumado a enfrentar problemas, os furacões; então em tudo já existe uma formação, uma cultura do dia a dia das pessoas, de cuidado”. Quanto às vacinas, Cuba tem desenvolvimento próprio de cinco imunizantes, e o mais promissor é a Soberana 2, que já está na terceira fase de testes e em breve será aplicada em toda a população, mesmo com um dos menores índices de mortalidade do mundo até o momento em função da pandemia. Cuba pretende produzir cerca de 100 milhões de doses de vacinas, e esse grande excedente será disponibilizado para os países mais pobres, tanto da América Latina, como da África.
Chioro denuncia também o caráter privatista do governo Bolsonaro na área da Saúde. Ele revela que no programa de governo do presidente, que não tinha mais que duas páginas, havia uma intenção clara de “desmonte do Programa Mais Médicos, pela sua substituição pelo ‘Médicos pelo Brasil’, e na minha opinião fazia parte do projeto de privatização”, já que envolveria a contratação de médicos e clínicas particulares para atenderem à rede pública.
Maria da Paz supervisionou entre 2013 e 2016 o Programa Mais Médicos, e elogiou os médicos cubanos integrados ao programa, mesmo estes sendo atacados pela direita e até por associações médicas brasileiras. “O Programa Mais Médicos e a presença massiva dos médicos cubanos, marcou fortemente no país todo”, atendendo em cidades e Estados – como no Norte e Nordeste – onde nenhum médico brasileiro queria trabalhar. “Então, quando os médicos cubanos saíram, a gente viu na prática, numa cidade do interior lá do Pará, que só tinha médicos cubanos, eles ficaram meses sem ter médico, porque a realidade era essa”, lamenta.
“Então acho que esse preconceito, essa ignorância, infelizmente pelos Bolsonaristas vai continuar, porque é uma forma de pensar, mas posso dizer que na prática foi demonstrado, desconstruiu muito o preconceito com relação aos médicos cubanos, e isso foi muito bom, foi muito positivo, demonstraram na prática que realmente são formados, são preparados; e a forma como lidam, a medicina humana, além da técnica. Fidel dizia: “-Vocês precisam ser médicos com ciência e consciência”, finaliza.
Arthur Chioro afirma que “o SUS é um patrimônio da população brasileira. Ele define, é um divisor de águas, se a gente vai viver numa sociedade do ponto de vista muito concreto: civilizada, ou se nós vamos optar pela barbárie. Mercado significará que as pessoas, 78% da população brasileira ficará deixada literalmente à sua própria sorte, sabendo que muitos vão estar condenados a não viver. E, ao mesmo tempo a gente tem uma oportunidade ímpar de colocar na agenda nacional o debate sobre o SUS, sobre a importância do Sistema Nacional de Saúde, até porque, e eu quero terminar dizendo isso, se tem uma certeza que a gente tem hoje, é que nós vamos ter outras pandemias, outras tragédias. No século 20 nós tivemos duas, no século 21 já é a quinta, a Covid, em 20 anos, duas décadas”, alertou.
PARA VER A ÍNTEGRA DA LIVE COM ARTHUR CHIORO E MARIA DA PAZ, NO CANAL AMIGOS ENFF DO YOUTUBE, ACESSE: https://www.youtube.com/watch?v=20Ja9WlYQ8I